Opinião

A “retroatividade tangível” na dedução dos intangíveis

Esta alteração foi particularmente relevante no que concerne (i) aos elementos da propriedade industrial – tais como marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados – adquiridos a título oneroso e sem vigência temporal limitada (caso contrário, poderiam ser amortizados nos termos do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro) e (ii) ao goodwill adquirido numa concentração de atividades empresariais (exceto se respeitante a partes de capital). Assim, no caso de se aplicável a dedução prevista no então aditado artigo 45.º-A do código do IRC, passou a ser aceite como como gasto fiscal, em partes iguais, durante os primeiros 20 períodos de tributação após o reconhecimento inicial, o custo de aquisição de tais ativos intangíveis. Desde logo, a dedução fiscal ficou limitada aos ativos intangíveis adquiridos em ou após 1 de janeiro de 2014, tendo a mesma sido vedada no caso de ativos intangíveis adquiridos (i) no âmbito de operações de fusão, cisão ou entrada de ativos, quando seja aplicado o regime especial de neutralidade fiscal ou (ii) a entidades residentes em país, território ou região sujeitos a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das…

Esta alteração foi particularmente relevante no que concerne (i) aos elementos da propriedade industrial – tais como marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados – adquiridos a título oneroso e sem vigência temporal limitada (caso contrário, poderiam ser amortizados nos termos do Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro) e (ii) ao goodwill adquirido numa concentração de atividades empresariais (exceto se respeitante a partes de capital).

Assim, no caso de se aplicável a dedução prevista no então aditado artigo 45.º-A do código do IRC, passou a ser aceite como como gasto fiscal, em partes iguais, durante os primeiros 20 períodos de tributação após o reconhecimento inicial, o custo de aquisição de tais ativos intangíveis.

Desde logo, a dedução fiscal ficou limitada aos ativos intangíveis adquiridos em ou após 1 de janeiro de 2014, tendo a mesma sido vedada no caso de ativos intangíveis adquiridos (i) no âmbito de operações de fusão, cisão ou entrada de ativos, quando seja aplicado o regime especial de neutralidade fiscal ou (ii) a entidades residentes em país, território ou região sujeitos a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

Ora, volvidos apenas 5 anos, o legislador pondera – através da redação constante da Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2019 (“PLOE 2019”) – introduzir mais uma (e deveras importante) limitação à dedução do gasto de aquisição dos referidos ativos intangíveis. Efetivamente, encontra-se em discussão uma disposição que, se aprovada, não permitirá a dedução do gasto, para efeitos fiscais, quando os ativos intangíveis em causa sejam adquiridos a entidades com as quais existam relações especiais nos termos definidos para as regras de preços de transferência.

Caso esta limitação venha a ser introduzida, operar-se-á uma discriminação relativamente às aquisições de ativos intangíveis entre entidades relacionadas, o que se afigura ser, à semelhança de muitas outras, uma norma anti abuso totalmente cega. Se, por um lado, as transações entre partes relacionadas devem respeitar as condições de mercado e de plena concorrência, sendo tributáveis os ganhos na alienação de ativos intangíveis (sem possibilidade de beneficiar do regime de reinvestimento do valor de realização, o que já se revela como uma desvantagem face a uma transação entre partes não relacionadas), por outro lado, tal norma inviabiliza a dedução fiscal na esfera da entidade adquirente (mais uma vez, resultando numa desvantagem face a uma transação entre partes não relacionadas).

É verdade que várias foram as transações desta natureza efetuadas nos últimos quase 5 anos e que, em substância, apenas visaram o aproveitamento e refrescamento de prejuízos fiscais. Contudo, a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) tem outros mecanismos para atuar e efetuar as correções que se revelem aplicáveis, não sendo necessário, e muito menos desejável, uma norma completamente desproporcional e que coloca em causa uma dedução fiscal só pela simples razão das partes intervenientes serem entidades relacionadas, ignorando por completo a substância económica da transação.

Refira-se que, em muitos casos, esta dedução tem funcionado como um importante incentivo para trazer para Portugal muitos ativos intangíveis que, de outra forma, continuariam a ser detidos por entidades estrangeiras que receberiam royalties das empresas portuguesas.

Mas se a eventual introdução da mencionada limitação já é uma péssima notícia, o pior mesmo é não se encontrar previsto um regime transitório, por exemplo, referindo expressamente que a nova limitação – caso a mesma venha a ser aprovada – apenas se aplica às aquisições (a partes relacionadas) de ativos intangíveis em ou a partir de 1 de janeiro de 2019. Na ausência de tal regime transitório, certamente veremos nos próximos anos uma escalada na litigância entre a AT e os contribuintes, porquanto, a AT poderá (previsivelmente) vir a entender que a nova limitação tanto se aplica nas situações já existentes como nas futuras aquisições de ativos intangíveis.

Por conseguinte, espera-se (talvez ingenuamente) que na discussão da PLOE 2019 na especialidade a referida limitação não venha a ser sequer aprovada, sob pena de representar uma clara discriminação relativamente às transações entre partes relacionadas. A não ser assim, pelo menos deverá assegura-se que a alteração legislativa não tenha efeitos retroativos, para evitar ferir irremediavelmente a legítima espectativa dos contribuintes que atuaram em estrito cumprimento com a lei vigente.