Opinião

Alterações à vista?

Há, de facto, uma sincera (porém ainda insuficiente) intenção governamental em favorecer a eficiência económica, por meio da promoção de medidas de alívio fiscal e atração de investimentos, de modo a aumentar competitividade do tecido empresarial português e, consequentemente, alavancar o crescimento económico das organizações e do próprio país.  É neste contexto que, no âmbito do Orçamento do Estado para 2022, aperfeiçoou-se o Patent Box Regim, de tal modo que os rendimentos provenientes da cedência de direitos de propriedade intelectual passaram a ser beneficiados com uma redução da tributação, em sede de IRC, concretamente, uma isenção de 85% para rendimentos de patentes, desenhos ou modelos industriais e direitos de autor sobre software. Adicionalmente, com a publicação do Orçamento do Estado para 2023, o Governo criou um incentivo fiscal à Capitalização das Empresas (ICE), no âmbito do qual passou a ser possível deduzir, durante 10 anos, ao lucro tributável uma importância correspondente à aplicação da taxa de 4,5% (majorada em 0,5 p.p., no caso de micro, pequena, média ou de pequena-média capitalização – Small Mid Cap) ao montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis. Essas duas medidas de desagravamento fiscal para o tecido empresarial, após terem entrado em vigor, têm…

Há, de facto, uma sincera (porém ainda insuficiente) intenção governamental em favorecer a eficiência económica, por meio da promoção de medidas de alívio fiscal e atração de investimentos, de modo a aumentar competitividade do tecido empresarial português e, consequentemente, alavancar o crescimento económico das organizações e do próprio país. 

É neste contexto que, no âmbito do Orçamento do Estado para 2022, aperfeiçoou-se o Patent Box Regim, de tal modo que os rendimentos provenientes da cedência de direitos de propriedade intelectual passaram a ser beneficiados com uma redução da tributação, em sede de IRC, concretamente, uma isenção de 85% para rendimentos de patentes, desenhos ou modelos industriais e direitos de autor sobre software.

Adicionalmente, com a publicação do Orçamento do Estado para 2023, o Governo criou um incentivo fiscal à Capitalização das Empresas (ICE), no âmbito do qual passou a ser possível deduzir, durante 10 anos, ao lucro tributável uma importância correspondente à aplicação da taxa de 4,5% (majorada em 0,5 p.p., no caso de micro, pequena, média ou de pequena-média capitalização – Small Mid Cap) ao montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis.

Essas duas medidas de desagravamento fiscal para o tecido empresarial, após terem entrado em vigor, têm vindo a suscitar (e ainda suscitam) dúvidas sobre a respetiva aplicabilidade, sobretudo quanto à correta interpretação das normas em causa.

Em face das dúvidas que a aplicação das referidas normas suscitou, foi apresentado recentemente, por parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, a Proposta de Lei n.º 35/XV/1.ª, cuja redação foi disponibilizada recentemente no portal oficial do Parlamento. No essencial, pretendem-se promover alterações e aditamentos relevantes à legislação fiscal, de modo a conferir maior estabilização e clareza interpretativa das normas em causa (mas não só), e consequentemente promover uma melhoria do sistema tributário português.

Quanto ao Patent Box Regim, pretende-se clarificar uma situação que estava a gerar alguma inquietação junto dos Contribuintes. De facto, por estarmos perante um benefício fiscal previsto no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), as alterações agora propostas apontam para tal regime não fique sujeito à limitação imposta pela regra do resultado da liquidação, prevista no artigo 92.º do referido Código, ou seja, a exigência de que o IRC liquidado seja superior à 90% do montante apurado pelo contribuinte na ausência de benefícios fiscais.  Foi esse, aliás, o entendimento recente que se percebeu que a Autoridade Tributária e Aduaneira tinha e que criou alguma perplexidade junto do mercado. 

Aliás, a pretensão do Projeto de Lei é ainda mais ampla, pois com exceção do regime previsto no n.º 13 do artigo 43.º do CIRC, inclui expressa disposição legal no sentido de que os benefícios fiscais constantes do CIRC não estão sujeitos à limitação prevista no respetivo artigo 92.º.

Inclusive, no caso de vir a ser aprovado o Projeto de Lei em questão, passará a estar contemplada do elenco dos benefícios fiscais a excluir da limitação ao resultado da liquidação o regime de incentivo fiscal à valorização salarial, o benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho e donativos de bens alimentares e, ainda, revogada a menção que havia ao antigo regime de dedução por lucros retidos e reinvestidos (DLRR).

Quanto ao ICE, o Projeto de Lei visa alterar o Estatuto dos Benefícios Fiscais, de modo a esclarecer dúvidas de interpretação acerca deste novo benefício fiscal. De acordo com a proposta apresentada pelo Partido Socialista:

  1. o ICE é aplicável ao exercício de 2023;
  2. por “aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis”, se entende a diferença, positiva ou negativa;
  • a aferição tem por base uma “conta corrente” com o somatório dos valores apurados no próprio e em cada um dos nove períodos de tributação anteriores, promovendo-se assim a estabilidade no reforço dos capitais das empresas;
  1. o montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis corresponde a zero nas situações em que a “conta corrente” referida em iii) apresente um valor negativo;
  2. a referência a “lucros contabilísticos” reporta-se aos lucros passíveis de distribuição nos termos do Código das Sociedades Comerciais, premiando-se assim a manutenção no capital dos lucros que eram efetivamente distribuíveis;
  3. a referência a “aplicação” dos lucros, reporta-se ao exercício em que a aplicação é efetivamente efetuada/contabilizada, i.e., ao exercício em que, após a deliberação, ocorre a aplicação em resultados transitados ou, diretamente, em reservas ou no aumento do capital; e
  • concretiza-se que o ICE não é aplicável aos Bancos nem às Empresas de Seguros.

Nota-se que este Projeto de Lei é uma medida positiva, ainda que num contexto de uma tímida (não ambiciosa) alteração tributária para o tecido empresarial. Inclusive, por ser de caráter interpretativo distinto ao que já se posicionou a Autoridade Tributária em fichas doutrinárias recentes (por exemplo, a ficha doutrinária n.º 022/0002101), caso aprovado, a alteração normativa poderá viabilizar um cenário propenso à elaboração de reclamações graciosas com vista a contestar o cálculo do resultado da liquidação.

Deste modo, perceciona-se aqui cenário positivo no ambiente normativo português. Entretanto, seria pertinente que outros benefícios fiscais fossem expressamente mencionados no rol de benefícios fiscais excluídos do resultado da liquidação, tal como é o caso do regime extraordinário de apoio a encargos com eletricidade e gás, o qual se encontra previsto em disposição legislativa própria.

Resta-nos aguardar pelo processo de aprovação da Proposta de Lei n.º 35/XV/1.ª na Assembleia da República para que as referidas alterações possam vir a ser implementadas com a maior brevidade possível, para que, por um lado, possa definitivamente ser establizado o entendimento interpretativo a conferir a estas temáticas, e, por outro lado, que se dê mais um passo no sentido de contribuir, pela via legislativa, para um ambiente empresarial português cada vez mais atrativo e competitivo.