Opinião

Incentivo à Capitalização das Empresas (“ICE”) – Uma boa alternativa de financiamento das Empresas

Há cerca de 1 ano redigi um pequeno texto sobre uma das questões (que à data de hoje ainda se encontra por clarificar) que pode suscitar tendencialmente alguma controvérsia sobre a aplicação do ICE em termos práticos, nomeadamente a regra que regula o reporte, para exercícios futuros, do excesso de dedução fiscal a título de ICE permitida à luz da lei.

Pretendo agora focar-me numa análise mais direcionada para uma visão de índole estratégica, a qual deverá ser adotada pelas Empresas quando estiverem a analisar a potencial aplicação deste benefício fiscal à sua realidade concreta.

Recordando, o ICE, foi criado pela Lei do Orçamento do Estado para 2023, e encontra-se atualmente vertido no artigo 43.º-D do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”).

A introdução do ICE no normativo jurídico-tributário português, acabou por constituir, com algumas particularidades, uma antecipação de uma Proposta de Diretiva Comunitária (i.e., a comummente designada por DEBRA – Debt-Equity Bias Reduction Allowance, e que se encontra em stand-by), a qual prevê a introdução de um mecanismo de dedução fiscal de montantes correspondentes ao aumento dos capitais próprios num ano fiscal, em condições semelhantes àquelas que se encontram previstas para a dívida em termos semelhantes ao do ICE.

Relembrando de forma sumária o que se encontra previsto na lei, o ICE caracteriza-se por uma dedução nocional ao lucro tributável (ou seja, uma ficção que o legislador criou no sentido de assimilar a referida dedução como se a Empresa tivesse incorrido em gastos de financiamento efetivos mediante o recurso a dívida), em sede de IRC, correspondente a um determinado percentual aplicado ao aumento líquido elegível dos capitais próprios da Empresa. Esse percentual, para o ano de 2025, corresponde à aplicação da taxa Euribor a 12 meses, que corresponda à média do período de tributação, calculada tendo por base o último dia de cada mês, adicionada de um spread de 2 pontos percentuais, ao montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis, sendo ainda majorada em 50%.

A título de exemplo, se tomarmos como pressuposto a aplicação da taxa Euribor a 12 meses que vigorava no início do mês de setembro de 2025 (i.e., 2,148%), adicionando os 2 pp, e a majoração de 50%, chegamos a um percentual de dedução potencial de 6,22% a aplicar aos aumentos dos capitais próprios elegíveis, o que pode culminar num interessante benefício fiscal.

Ora, é exatamente aqui que se pretende chegar para partir para uma análise mais estratégica. De facto, se considerarmos que uma das componentes de aumento dos capitais próprios elegíveis passa por a Empresa reter, na sua esfera patrimonial, os resultados positivos gerados num dado exercício, mediante a transferência dos mesmos para resultados transitados, não poucas vezes se suscita a questão se fará sentido optar por essa via (i.e., reter os resultados) ou efetuar uma distribuição de dividendos / lucros aos respetivos acionistas / sócios.

De facto, constata-se, não raras vezes, que existem grupos económicos, mais de cariz multinacional, que têm uma política ativa de distribuição de resultados, motivada, em regra, por questões de gestão de tesouraria, pelo que acabam sempre por avançar para uma distribuição de resultados, inviabilizando, por essa via, uma potencial aplicação (e otimização) do ICE.

Todavia, poderão ser equacionadas alternativas que permitam canalizar os fundos gerados pela Empresa para os acionistas / sócios que permitam, por um lado, atingir o objetivo de gestão de tesouraria delineado (v.g., por exemplo, mediante a utilização de contratos de gestão centralizada de tesouraria – cash pooling), e, por outro lado, transferir os resultados gerados para resultados transitados, permitindo, por essa via a aplicação do ICE com todas as consequências positivas de natureza fiscal que daí advêm.

Cada vez mais se tem vindo a constatar que a aplicação do ICE não se reconduz apenas a um cálculo aritmético de natureza fiscal, sendo, igualmente, uma interessante ferramenta de gestão financeira que pode permitir uma otimização adequada para as empresas.

Fica o desafio para que definitivamente se pense na aplicação deste benefício fiscal de uma forma mais estratégica!