De acordo com a Portaria n.º 268/2021 de 26 de novembro, onde se procedeu à revisão da regulamentação de preços de transferência, mais concretamente o n.º 8 do artigo 17.º, a documentação de preços de transferência, a partir do período de tributação de 2021, deve conter, entre outros elementos, informação relativa ao grupo nomeadamente no que respeita a transações intragrupo efetuadas por entidades que o constituem, bem como o resultado líquido apurado e o montante de imposto sobre o rendimento pago, de cada uma delas, referentes ao período de tributação a que respeita a documentação e aos dois períodos anteriores.
De facto, estes novos elementos a incluir na documentação de preços de transferência, revelaram-se bastante desafiantes, sobretudo para os contribuintes que, inseridos em grandes grupos económicos, não têm sequer acesso a esta informação ao nível do acionista. Neste contexto, torna-se particularmente difícil perceber o alcance desta obrigatoriedade uma vez que, por um lado, conforme já referido, torna-se muitas vezes inviável o seu cumprimento por parte do contribuinte e, por outro lado, a legitimidade da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) pedir ao contribuinte sedeado em Portugal informação relativa a transações entre entidades sedeadas fora do território nacional e que podem até não ter quaisquer transações ou relações comerciais com a entidade sedeada em Portugal, sob pena de aplicação de coimas.
Considerando que a AT já tem ao seu dispor: (i) acordos de troca automática de informação com múltiplas jurisdições que permitem que esta receba a informação referente aos contribuintes que integram grupos sujeitos à obrigatoriedade de preparação de country-by-country reporting (CbCR) bem como (ii) outros acordos de troca de informação com várias jurisdições para outras matérias, este pedido de informação adicional tão extenso parece ainda menos razoável. A destacar também que o prazo para cumprimento da obrigação em Portugal, o décimo quinto dia do sétimo mês após o fecho do exercício, é anterior ao prazo exigido em múltiplas jurisdições para preparação do Master File e do próprio CbCR o que dificulta ainda mais que as entidades em Portugal consigam dar resposta atempada a estas novas exigências.
Assim, fica a questão sobre a razoabilidade deste requisito no cumprimento das regras de preços de transferência por parte dos contribuintes visados. Terá a AT legitimidade para exigir aos contribuintes, sob pena de aplicação de coima, informação sobre transações intragrupo de entidades suas relacionadas (e que em nada impactam a atividade dos mencionados contribuintes), sedeadas em outros Estados que, na maior parte dos casos, dada a complexidade dos grandes grupos económicos, esta nem sequer tem acesso? Dito de outro modo, qual é o efeito útil desta exigência declarativa na perspetiva da AT portuguesa? São dúvidas legítimas que carecem de uma resposta.