A verba 2.27 da Lista I anexa ao Código do IVA determina a aplicação da taxa reduzida de IVA (atualmente, 6%, para operações praticadas no Continente) às empreitadas de beneficiação, remodelação, renovação, restauro, reparação ou conservação de imóveis ou partes autónomas destes afectos à habitação, contemplando ainda algumas excepções a esta regra (trabalhos de limpeza, manutenção dos espaços verdes e trabalhos associados a piscinas, saunas, campos de ténis, golfe ou minigolfe ou instalações similares). Esta taxa reduzida não abrange os materiais incorporados, salvo se o respectivo valor não exceder 20% do valor global da prestação de serviços.
A referida verba corresponde ao atual ponto 10 do Anexo III à Diretiva IVA, de acordo com o qual podem ser sujeitos à taxa de IVA reduzida os serviços de “renovação e modificação, incluindo demolição e reconstrução, e reparação de habitações e residências particulares” (na redação dada pela Diretiva 2022/542, de 5 de abril de 2022, ainda não transposta para a legislação nacional). À data dos factos que estão na base da decisão sobre a qual versamos no presente artigo, previa o ponto 2 do Anexo IV da Diretiva IVA que poderiam ser sujeitos à taxa de IVA reduzida os serviços referentes a “Obras de reparação e renovação em residências particulares, excluindo os materiais que representam uma parte significativa do valor do serviço prestado.”
A respeito da delimitação da aplicação da referida verba 2.27, pronunciou-se já, por diversas vezes, a AT – refira-se o Ofício-Circulado n.º 30135, de 26/09/2012- , no sentido de que a mesma deve ser interpretada restritivamente, particularmente no que respeita ao conceito de “imóveis afectos à habitação”, no qual não caberiam equipamentos como elevadores, escadas rolantes e outros. De facto, de acordo com o entendimento dos Serviços, a ratio legis subjacente à referida verba não permitiria a sua aplicação a serviços de reparação de equipamentos que sejam partes integrantes de imóveis (como são os elevadores, escadas rolantes, entre outros) que estariam, assim, sujeitos à taxa normal de IVA.
Ora, foi precisamente no âmbito de um processo que opôs a AT a um sujeito passivo de IVA nacional (que havia aplicado a taxa reduzida de IVA à prestação de serviços de remodelação e reparação de elevadores) – que resultou num pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal Administrativo ao TJUE – que este se pronunciou no sentido de que os serviços de reparação e renovação de elevadores afetos à habitação devem considerar-se abrangidos pelo conceito de “reparação em residências particulares”.
A decisão do TJUE assenta, primeiramente, no entendimento que que o conceito de “residências particulares” deverá ser entendido como abrangendo as instalações partilhadas das mesmas (nas quais se incluem os elevadores), por se tratarem de meios indispensáveis à utilização das próprias frações destinadas à habitação. Estas considerações vão em sentido contrário ao entendido pela AT, que, no âmbito do processo em análise, e em linha com o defendido em instruções administrativas, considerou que a expressão “residências particulares” seria apenas referente às frações autónomas de um imóvel efetivamente destinadas à habitação, individualmente consideradas, não estando abrangidas na mesma as instalações partilhadas.
Ainda no âmbito do referido processo, alertou o TJUE para o facto de não constar do texto legal nacional (i.e., da redação da atual verba 2.27, que, à data dos factos, correspondia à verba 2.24) qualquer indicação de que o legislador português tenha a intenção de excluir do âmbito da aplicação da taxa reduzida de IVA os serviços relativos a elevadores de imóveis afetos à habitação, assentando o entendimento restritivo da AT em instruções administrativas internas. A este respeito, reforçou o referido Tribunal que os Estados-Membros não podem invocar simples práticas administrativas (modificáveis ao critério da administração fiscal) para demonstrar a transposição seletiva de uma disposição da Diretiva IVA.
Em suma, com a referida decisão, o TJUE vem contrariar o entendimento da AT a respeito da (não) aplicação da taxa reduzida de IVA aos serviços de reparação de elevadores, confirmando que tais serviços deverão beneficiar da referida taxa, quando estejam inseridos em imóveis afetos à habitação. O Tribunal salienta, no entanto, que a aplicação da taxa reduzida não se deverá estender aos serviços de manutenção destes equipamentos, na medida em que esta prerrogativa apenas deve ser considerada para serviços de carácter ocasional, e não prestados de forma regular e contínua, como acontece com os serviços prestados no âmbito de contratos de manutenção.
Em face desta decisão, entendemos que Autoridade Tributária poderá ver-se obrigada a rever a sua posição a respeito da (não) tributação dos serviços de reparação de elevadores, inseridos em imóveis afetos à habitação, à taxa reduzida de IVA
Não obstante, cumpre salientar que esta temática foi alvo de alteração recente pela Diretiva 2022/542, de 5 de abril de 2022 (que atualiza as regras de IVA relativamente à aplicação das taxas reduzidas), que modificou a redação da previsão respeitante à aplicação da taxa reduzida de IVA a serviços de reparação e renovação em residências particulares (que passa, assim, a estar prevista no ponto 10 do Anexo III à Diretiva de IVA, e não no ponto 10-A). Embora, relativamente ao tema versado no presente artigo – aplicação da taxa reduzida de IVA a serviços de reparação de elevadores -, tais alterações não se mostrem, à primeira vista, significativas, há que aguardar a transposição da referida Diretiva pelos Estados-Membros (que poderá acontecer até ao final de 2024), e, em particular, pelo Estado português, de forma compreender qual será a evolução da Verba 2.27 na legislação portuguesa.