Opinião

A transformação parlamentar do Orçamento do Estado para 2023 e o que pode esperar (e desesperar) o setor imobiliário

Foi aprovado pelo Parlamento mais um OE que, sendo promulgado pelo Presidente da República, vigorará a partir de 1 de janeiro de 2023. No que toca ao setor imobiliário, o OE para 2023 foi apresentado pelo Governo numa versão inicial discreta, sem medidas significativas de estímulo ou de compensação do acréscimo dos custos de construção, de matérias-primas, de mão-de-obra exacerbados pela inflação crescente nos últimos meses. No entanto, a passagem do documento pelo Parlamento introduziu à redação duas medidas que vão impactar a atividade de investimento e promoção imobiliária, restringindo a aplicação de regimes de tributação favoráveis aos investidores. Por um lado, foi introduzida uma limitação à aplicação da regra especial de cálculo de IMT em caso de permutas de imóveis. A permuta de imóveis tem vindo a ser uma opção fiscalmente atrativa para a transação de ativos imobiliários, já que, nestes casos, o IMT incide apenas sobre a diferença dos valores dos imóveis permutados (i.e., dos valores declarados pelas partes ou dos respetivos valores patrimoniais tributários, se superior), sendo apenas devido pela parte que adquire o imóvel de maior valor. No entanto, tem vindo a assistir-se a um conjunto crescente de transações viabilizadas com recurso a terceiros intervenientes que…

Foi aprovado pelo Parlamento mais um OE que, sendo promulgado pelo Presidente da República, vigorará a partir de 1 de janeiro de 2023.

No que toca ao setor imobiliário, o OE para 2023 foi apresentado pelo Governo numa versão inicial discreta, sem medidas significativas de estímulo ou de compensação do acréscimo dos custos de construção, de matérias-primas, de mão-de-obra exacerbados pela inflação crescente nos últimos meses.

No entanto, a passagem do documento pelo Parlamento introduziu à redação duas medidas que vão impactar a atividade de investimento e promoção imobiliária, restringindo a aplicação de regimes de tributação favoráveis aos investidores.

Por um lado, foi introduzida uma limitação à aplicação da regra especial de cálculo de IMT em caso de permutas de imóveis. A permuta de imóveis tem vindo a ser uma opção fiscalmente atrativa para a transação de ativos imobiliários, já que, nestes casos, o IMT incide apenas sobre a diferença dos valores dos imóveis permutados (i.e., dos valores declarados pelas partes ou dos respetivos valores patrimoniais tributários, se superior), sendo apenas devido pela parte que adquire o imóvel de maior valor. No entanto, tem vindo a assistir-se a um conjunto crescente de transações viabilizadas com recurso a terceiros intervenientes que nelas participam com o intuito principal de viabilizarem um negócio de permuta, com as vantagens que já referimos, ao invés de uma (ou várias) compras e vendas – as apelidadas pelo mercado de “permutas técnicas”. Veja-se o caso em que o Sr. A pretende adquirir o imóvel do Sr. B, mas em que o Sr. B quer, no entanto, comprar o imóvel do Sr. C. O Sr. B e o Sr. C permutam os seus imóveis e de seguida o Sr. C vende o seu imóvel ao Sr. A. Desta forma, o Sr. C viu facilitada a venda do seu imóvel, o Sr. B viu reduzida (ou anulada) a sua fatura de IMT através da permuta que conseguir concretizar e o Sr. A comprou a casa que tinha em vista.

Considerando este tipo de negócios uma prática abusiva e reprovável apelidada de “fuga ao fisco”, entendeu por bem o Grupo Parlamentar do PS negar a aplicação do regime benéfico de IMT aplicável às permutas, ao todos em casos em que os imóveis permutados sejam novamente transferidos no prazo de um ano após a permuta. Nestes casos e ainda que a redação do OE 2023 não seja totalmente clara, serão aplicadas as regras normais de cálculo de IMT, passando o mesmo a ser pago por ambas partes sobre o imóvel respetivamente adquirido. Não se esclarece porém se é dada hipótese ao permutante que haja adquirido o imóvel de maior valor na permuta de deduzir ao novo IMT a pagar o imposto que já tenha pago.

A uma primeira vista, consideramos que esta alteração encerra uma presunção inilidível de que toda e qualquer permuta em que uma das partes vende novamente o imóvel adquirido no espaço de 1 ano corresponde a uma transação não genuína, o que a nosso ver vai ao arrepio dos princípios basilares que conformam o nosso direito fiscal. Com efeito, são abrangidas por este agravamento de tributação os casos em que um permutante pretende voltar a vender o imóvel adquirido por permuta, por ter encontrado um imóvel preferencial ou por precisar de liquidez. E são ainda abrangidas situações de permuta de bens presentes (p. ex. lotes de terreno) por bens futuros (p. ex. frações que venham a ser construídas nos referidos lotes) em que o permutante que recebe as frações as pretende comercializar logo após a concretização da permuta. Parece-nos, pois, de mérito limitado esta alteração, sobretudo nos termos em que a mesma foi redigida.

Outra alteração que terá impacto nos planos de negócio dos investidores imobiliários, desta vez promovida pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, prende-se com as condições de acesso à isenção de IMT aplicáveis aos agentes que adquiram imóveis para revenda. Recorde-se que esta isenção tem como desiderato desonerar os agentes que exerçam a uma atividade de trading de imóveis do pagamento de IMT. Até hoje, para que a isenção se aplique, é necessário que o comprador assegure que, no ano anterior ao da compra adquiriu para revenda ou revendeu para esse fim qualquer tipo de imóvel, i.e., que exerceu a atividade de trading. Com o OE 2023, passará a ser necessário assegurar que esta atividade de trading foi exercida nos dois anos anteriores à compra de um imóvel.

Note-se que, não sendo possível aplicar esta isenção, o agente terá sempre a possibilidade de reaver o IMT pago na compra do imóvel caso o revenda num espaço de 3 anos, pelo que a alteração introduzida vem criar um obstáculo adicional à atividade de trading e promoção imobiliária que nos parece desajustada, principalmente atendendo aos já tão elevados custos de contexto que impedem sobre a mesma, especialmente quando entra em cena o AIMI ou o IVA não dedutível em serviços de construção civil e reabilitação de edifícios. Por outro lado, permite ao Estado reter nos seus cofres um montante de IMT que terá de qualquer forma de devolver ao comercializador dos imóveis caso a revenda se concretize no espaço de 3 anos, o que cria constrangimentos de tesouraria injustificados nos agentes do setor, num momento em que o aumento das taxas de juro dificultam as contas do financiamento de projetos imobiliários.

Depois da transformação parlamentar a que foi submetido, o OE 2023 vai apresentar-se aos investidores imobiliários como mais restritivo e mais penalizador. Motivos para dizer: ano novo, impostos velhos e revigorados!