O Alojamento Local (AL) tem sido um tema amplamente debatido e, muito recentemente, com diversas intervenções legislativas, especialmente no âmbito do Programa “Mais Habitação”. O setor do AL tem tido um aumento exponencial nos últimos anos, com um impacto significativo tanto na economia local como no mercado imobiliário, a crescer consistentemente, especialmente nas grandes cidades e zonas turísticas, o que resultou, assim, na necessidade de regulamentação especifica.
No Programa “Mais Habitação”, relativamente ao AL, entre outras medidas, destacava-se a suspensão de novos registos de AL (com exceção dos territórios do interior), a reapreciação dos registos de AL já emitidos em 2030 ou a possibilidade de oposição ao exercício da atividade de AL e autorização do condomínio. Já em termos fiscais, destacavam-se ainda as seguintes medidas:
- Criação de uma contribuição extraordinária sobre os AL – não se pretende aprofundar a referência a “extraordinária” da contribuição, que sabemos que em Portugal é sinónimo de “comum” e permanente;
- Fixação do coeficiente de 1 (um) para os AL – de forma simplificada, este coeficiente é um fator utilizado para calcular o valor patrimonial tributário dos imóveis (que é a base para o cálculo do IMI), e que tem em consideração a “idade” do imóvel;
- Isenção no IRS dos rendimentos prediais (ex. rendas) na transferência de AL para habitação permanente, para os AL registados até 31 de dezembro de 2022, desde que a celebração do contrato de arrendamento ocorra até 31 de dezembro de 2024.
De entre estas três medidas, conclui-se que a última, que visava a transferência de imóveis de AL para arrendamento habitacional, é, efetivamente, aquela que estabelecia um incentivo a um comportamento por via da desoneração, enquanto as restantes determinavam um agravamento da tributação sobre a atividade do AL.
A contribuição, a uma taxa de 15 % sobre a afetação de imóveis habitacionais a AL, foi justificada pela necessidade de equilibrar o mercado imobiliário e garantir que os proprietários de AL contribuíssem de outra forma. Adicionalmente, o coeficiente, que normalmente diminui à medida que os anos passam, isto é, que tem em consideração a “idade” do imóvel e que é suposto reduzir ao longo dos anos (p.ex., um imóvel com 1 ano tem o coeficiente de 1, enquanto o de 30 anos tem o coeficiente de 0,75), refletindo a depreciação do imóvel; ou seja, a fixação do coeficiente em 1, viria a resultar num aumento do IMI a pagar pelos proprietários de AL.
Ora, colocando em perspetiva o impacto do AL, tenha-se em consideração um estudo recente (“A Perceção do Valor do Turismo em Portugal”) que refere que, em 2023:
- Correspondeu a 42% do total de dormidas registadas;
- Representou, no total de dormidas, 48% em Lisboa e 60% no Porto;
- Seriam necessários 1600 novos hotéis no país (mantendo o rácio de dormidas por hotel) para corresponder à procura.
Assim, após a aprovação daquele Programa “Mais Habitação”, o figurino mudou e um novo Governo assumiu funções.
Face ao impacto negativo que as alterações legislativas tiveram no setor do AL – a título de exemplo, reportava-se que as novas licenças de AL tinham diminuído 64% face ao mesmo período de 2023 (entre o início e metade do ano de 2024) –, o atual Governo procedeu a várias reversões, nomeadamente a revogação das medidas acima referidas.
Deste modo, num período marcado por várias regras e crescente burocracia, é importante notar e clarificar o seguinte: estas revogações resultam que, na prática, a contribuição não é aplicada (não chega, assim, sequer a ser devida – o que até implicou que o Governo viesse a corrigir o seu diploma que inicialmente previa que a contribuição tivesse efeitos durante 1 ano), nem o coeficiente é aplicado, mantendo-se, deste modo, as regras fiscais que vigoravam anteriormente.
Entende-se a nova abordagem para este setor, que visa uma harmonização com as restantes atividades e que vem também evitar litígios que já seriam expectáveis – como a eventual inconstitucionalidade da contribuição por violação do princípio constitucional da capacidade contributiva.
Além disso, considerado o panorama atual, compreende-se ainda que é intenção do Governo promover “áreas de contenção e de crescimento sustentável” (como definidas no mais recente Decreto-Lei), remetendo essa competência para os municípios.
Resta, por isso, perceber se o Governo entende que o capítulo, em termos fiscais, está fechado ou se há margem para incentivar o AL noutras áreas ainda por explorar e cuja penetração seria bem-vinda, para a coesão territorial e, bem assim, para a economia local.
Face ao exposto, voltamos à normalidade fiscal no AL ou será possível sermos mais ambiciosos?