Opinião

Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) – A legitimidade de um tributo “ilegal”

Começando por explicar a CSR, importa referir que estamos perante um tributo com uma longa história, sendo que um dos factos mais relevantes é a finalidade para a qual o mesmo foi criada, i.e., o financiamento da rede rodoviária nacional, responsabilidade a cargo da Infraestruturas de Portugal, S.A. (“I.P., S.A.”). No entanto, a decisão do TJUE veio a ditar a sua extinção, o que acabou por suceder em resultado da publicação da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro mediante a transposição das Diretivas (UE) 2019/2235, 2020/1151 e 2020/262, no âmbito da qual a mesma foi integrada no Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP), alterando-se a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, passando a prever-se a consignação parcial da receita do IISP, tendo em vista financiar a rede rodoviária nacional. Voltando agora à decisão do TJUE, este tribunal veio, de uma forma resumida, declarar que a CSR configurava um imposto indireto incompatível com a Diretiva Europeia dos Impostos Indiretos (e como tal, ilegal) e que, tendo por base uma cobrança de um tributo “ilegal”, não podem as autoridades fiscais de um Estado Membro da UE fundamentar a recusa de reembolsar esse tributo com base numa presunção de que o…

Começando por explicar a CSR, importa referir que estamos perante um tributo com uma longa história, sendo que um dos factos mais relevantes é a finalidade para a qual o mesmo foi criada, i.e., o financiamento da rede rodoviária nacional, responsabilidade a cargo da Infraestruturas de Portugal, S.A. (“I.P., S.A.”).

No entanto, a decisão do TJUE veio a ditar a sua extinção, o que acabou por suceder em resultado da publicação da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro mediante a transposição das Diretivas (UE) 2019/2235, 2020/1151 e 2020/262, no âmbito da qual a mesma foi integrada no Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP), alterando-se a Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, passando a prever-se a consignação parcial da receita do IISP, tendo em vista financiar a rede rodoviária nacional.

Voltando agora à decisão do TJUE, este tribunal veio, de uma forma resumida, declarar que a CSR configurava um imposto indireto incompatível com a Diretiva Europeia dos Impostos Indiretos (e como tal, ilegal) e que, tendo por base uma cobrança de um tributo “ilegal”, não podem as autoridades fiscais de um Estado Membro da UE fundamentar a recusa de reembolsar esse tributo com base numa presunção de que o mesmo terá sido repercutido sobre terceiros.

Com base neste cenário, foram vários os contribuintes que a “reboque” desta decisão do TJUE, encetaram os procedimentos previstos na Lei no sentido de serem reembolsados dos montantes da CSR pagos indevidamente de modo a verem a ser reposta a justiça da sua situação tributária.

De facto, nos termos anteriormente previstos na Lei (note-se que a CSR, enquanto tributo autónomo, foi revogada em 2023, tal como referido anteriormente, passando o seu valor a ser incorporado no ISP, sendo curioso, ou talvez não, após a decisão do TJUE) a CSR era um tributo que incidia sobre o consumo de combustíveis, correspondendo o seu quantitativo a €0,111 por litro de gasóleo e a €0,087 por litro de gasolina, estando assim, portanto, incluída no preço final pago pelos contribuintes no momento do abastecimento / aquisição de combustível junto dos postos de abastecimento. Não existe, contudo, um documento de liquidação da CSR por parte dos contribuintes, pois essa é liquidada por parte das entidades que introduzem os combustíveis no mercado (i.e., as gasolineiras), mas haveria uma prova indireta, na medida em que por cada litro de combustível adquirido estar-se-ia a pagar um valor de CSR, nos termos anteriormente comentados.

Dada a dimensão que esta situação poderia ter para o erário público, (i.e., potencial necessidade de restituição de valores significativos por parte do Estado português), a mesma foi inclusivamente alvo de notícias com honras de primeira página em jornais de cariz económico, o que talvez tenha causado algum “alarme” junto das entidades competentes.

Contudo, e como diz o famoso ditado popular, parece que, afinal, a “montanha pariu um rato”, ou seja, a avaliar pelo teor da mais recente jurisprudência emitida pelo Tribunal Arbitral (i.e., pelo Centro de Arbitragem Administrativa – “CAAD”) sobre este tema, que tem sido consistente, no sentido de não dar provimento a essa pretensão dos contribuintes. De facto, foi pelo recurso ao CAAD que a maior parte dos contribuintes terá optado para pedir a restituição da CSR, nomeadamente por uma questão de celeridade, na medida em que o recurso para o CAAD permite obter decisões rápidas em matérias de índole tributária, aliado ao facto de existir uma forte convicção que o CAAD iria seguir a linha argumentativa do TJUE. Não obstante, e nos últimos meses (v.g., o mês de agosto de 2024 foi particularmente “rico” em decisões), o CAAD emitiu várias decisões no sentido de negar provimento aos pedidos de restituição de CSR formulados pelos contribuintes.

São vários os argumentos invocados (todos de natureza formal), tais como: a) inaptidão do CAAD para julgar a matéria em causa, pois refere-se que a CSR é uma contribuição financeira e não um imposto (sendo certo que o TJUE considerou a CSR um imposto incompatível com a Diretiva dos Impostos Indiretos); b) falta de prova, pois os contribuintes não conseguem demonstrar que pagaram valores de CSR, dado que as faturas de abastecimento de combustível não fazem menção à cobrança da CSR e c) falta de legitimidade, pois os contribuintes não liquidaram CSR e por isso não têm legitimidade para pedir essa restituição.

Ainda assim, e dado existirem outras decisões do próprio CAAD em sentido contrário, é provável que existam contribuintes que recorram para outros órgãos jurisdicionais, nomeadamente junto do Supremo Tribunal Administrativo, no sentido de solicitarem um Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, com o intuito de aclararem e clarificarem esta temática de forma definitiva.

Nesta fase, o que parece resultar daqui, é que a existência de tributos ilegais em Portugal parece ter legitimidade, pois o refúgio em aspetos de natureza formal que agora transparecem do lado dos tribunais (i.e., do CAAD) parece prevalecer sobre aspetos substantivos e isso penaliza fortemente a avaliação que se faz do sistema fiscal, nomeadamente, por parte de potenciais investidores internacionais.

Teremos de aguardar por mais desenvolvimentos, pois esta história ainda não terminou!