De facto, caso este regime não seja devidamente acionado, a isenção aplicável a estas operações irá condicionar a dedução do IVA incorrido com as inerentes despesas, o que, consequentemente, contribuirá para a distorção do comportamento dos sujeitos passivos, em especial no que concerne à extensão das cadeias de produção e distribuição. Ora, o objetivo último do IVA é tributar a capacidade económica evidenciada nos atos de consumo e não a atividade económica realizada pelos sujeitos passivos. E é este objetivo que se pretende assegurar quando o Código do IVA (com respaldo na Diretiva do IVA) prevê a possibilidade de opção pela tributação no caso da venda ou arrendamento de imóveis, desde que verificadas determinadas condições.
Com efeito, são diversas as condições – substantivas e formais – que, antes da celebração dos contratos de arrendamento ou das escrituras de compra e venda dos imóveis, terão que ser acauteladas para que a renúncia à isenção do IVA sobre estas operações possa efetivamente produzir os efeitos desejados.
Uma das condições substantivas é que o imóvel seja afeto a atividades que confiram direito à dedução do IVA suportado nas aquisições. No entanto, e uma vez que a lei (em particular, o Decreto-Lei n.º 21/2007) não estabelece para esta condição um limite temporal, coloca-se a questão de saber se, no momento da renúncia à isenção, é necessário que exista afetação imediata do imóvel a operações tributadas em IVA.
Esta questão tem particular interesse quando se pretende renunciar à isenção do IVA na venda de um imóvel destinado a posterior arrendamento, o qual só poderá considerar-se sujeito a IVA no momento em que for celebrado o contrato de arrendamento e desde que previamente tenha sido obtido certificado de renúncia válido, o que, em termos práticos (e legais), só poderá ocorrer em momento posterior ao da venda do imóvel. Ou seja, no caso em que é celebrada a escritura de compra e venda de um imóvel objeto de posterior arrendamento, poderemos afirmar que o mesmo não se encontra “afeto” a atividades tributadas? Será que este facto pode invalidar a renúncia à isenção do IVA na venda do imóvel?
Aparentemente a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) tem entendido que, quando um imóvel adquirido não seja imediatamente afeto a operações tributadas em IVA, a venda não poderá beneficiar da renúncia à isenção e, como tal, deverá ser isenta de IVA. Acresce que, neste contexto, a AT tem-se socorrido também do mecanismo de regularização do IVA deduzido indevidamente com base no argumento de que um imóvel desocupado por um determinado período de tempo interrompe a afetação do mesmo aos fins da empresa, mesmo que se prove que o sujeito passivo teve sempre a intenção de continuar a exercer uma atividade tributada.
Esta interpretação da AT foi em diversas circunstâncias contestada pelos sujeitos passivos intervenientes em operações desta natureza, sendo de referir que, recentemente, o CAAD pronunciou-se (mais uma vez) no sentido inverso ao preconizado pela AT, tendo por referência, em particular, jurisprudência comunitária (v.g., caso Imofloresmira). Neste contexto, o CAAD entendeu que a AT faz equivaler erradamente o conceito de “afetação” ao de “utilização” no que respeita à condição de que “O imóvel seja afeto a atividades que confiram direito à dedução do IVA suportado nas aquisições” – necessária para operar a renúncia à isenção do IVA. Consequentemente, a utilização efetiva que venha a ser dada ao imóvel que haja sido afetado a operações tributadas em IVA, não deverá prejudicar a renúncia à isenção do transmitente ou locador, sob pena de a tornar eventual ou precária, ou seja, sob condição, sem que nada na lei sugira que seja essa a intenção legislativa. Conclui-se, portanto, que o que releva para efeitos de renúncia à isenção do IVA na venda ou locação de um imóvel é a afetação do mesmo, aquando da transmissão ou locação, a atividades que confiram direito à dedução do IVA suportado nas aquisições, não relevando a dilação de tempo ocorrida entre o momento da aquisição e o da efetivação da afetação dada. Por outro lado, esta dilação, quando devidamente justificada, não deverá determinar, de forma cega, a regularização a favor do Estado do IVA deduzido. É importante não esquecer que a dedução do imposto subsiste, mesmo que, o sujeito passivo não possa, por razões independentes da sua vontade, utilizar os bens ou os serviços que estão na origem da dedução no âmbito de operações tributadas.