Embora criado apenas com a Lei do Orçamento do Estado para 2017, o Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), popularmente conhecido por “Imposto Mortágua”, teve na sua génese a Verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), nos tempos da austeridade da Troika, nomeadamente em 2012.
O objetivo do legislador com a Verba 28 da TGIS era o de promover a equidade fiscal, através da tributação das pessoas e empresas com maior capacidade contributiva, revelada pela detenção de “casas de luxo” de valor superior a 1 milhão de euros. Nessa senda, o AIMI democratizou o conceito de “imóveis de luxo” e passou a tributá-los, desde que o valor da soma dos Valores Patrimoniais Tributários (“VPT”) fosse superior a € 600.000 por pessoa singular.
Eis que agora a História do Imposto Mortágua tem nova sequela. Desta vez, “os ricos” a tributar são os cônjuges sobrevivos e os herdeiros das heranças indivisas – ainda que numa situação de fragilidade emocional e (eventualmente) económica.
De facto, por não disporem de personalidade jurídica, as heranças indivisas foram sempre englobadas pelo legislador, na categoria de sujeito passivo de AIMI. Nesse sentido, o AIMI é devido pela própria herança indivisa, representada pelo cabeça de casal, e calculado tendo por referência a soma dos VPT dos prédios sujeitos a AIMI da sua titularidade, deduzido do montante de € 600.000 e aplicando-se sobre esse resultado, quando positivo, a taxa de 0,7%.
Com efeito, pretendeu o legislador garantir que o óbito do titular dos prédios sujeitos a AIMI não espoletasse um aumento do imposto devido em relação ao património do falecido, o qual integra a herança indivisa.
No entanto, temo-nos deparado, nalgumas situações, com a prática por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”), da afetação integral do património do casal sujeito a AIMI à herança indivisa, na sequência do óbito de um dos cônjuges, nomeadamente em situações de casamento em comunhão geral de bens, ao invés apenas da respetiva metade, e não obstante o correto cumprimento da obrigação de entrega da Declaração Modelo 1 de Imposto do Selo para efeitos de transmissões gratuitas, identificando-se expressamente a quota-parte do(s) prédio(s) que cabe à herança indivisa e ao cônjuge sobrevivo.
Desta forma, o AIMI encontra-se a incidir, nestas situações, sobre uma parcela de património que não é da titularidade da herança indivisa, mas antes do cônjuge sobrevivo, acumulando a herança indivisa a totalidade do património, o que conduz apenas à dedução de € 600.000, com prejuízo para todos os herdeiros – no qual se inclui, desde logo e em primeiro lugar, o cônjuge sobrevivo.
Naturalmente, caso o apuramento do AIMI devido pela herança indivisa tivesse por base apenas a parte do VPT correspondente a metade do património sujeito a AIMI, quer o cônjuge sobrevivo, quer a herança indivisa – teriam direito, cada um, à dedução respetiva de € 600.000,00 o que perfaz uma dedução total acumulada de € 1.200.000.
Esta prática consubstancia, assim, uma autêntica inovação fiscal oficiosa, desta feita da autoria da AT, ao arrepio da lei, da qual resulta que os herdeiros são forçados a pagar imposto adicional ou “adicional ao adicional” face ao que a própria lei estipula.
Na sequência deste procedimento e liquidação, resta à herança indivisa lançar mão dos meios de reação previstos na lei, nomeadamente proceder à apresentação de reclamação graciosa ou solicitar a revisão do ato tributário. Cumulativamente, deverá, ainda, ser solicitada a revisão oficiosa das matrizes prediais por forma a prevenir que esta situação não se repita em anos subsequentes, com prejuízo anual recorrente para todos os herdeiros.
Fiquemos, portanto, atentos aos próximos desenvolvimentos daquilo que parece ser um adicional ao AIMI, i.e., um “Adicional ao Imposto Mortágua”.