Opinião

O Orçamento do Estado de 2024 pode ter impacto no exercício fiscal de 2022?

O Orçamento do Estado (“OE”) de 2023 criou o regime extraordinário de apoio a encargos suportados com eletricidade e gás. O referido regime consubstancia-se num benefício fiscal, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), que, de forma sumária, permitiu aos contribuintes (com atividades económicas não excluídas para efeitos do referido regime) deduzir ao resultado fiscal – desde logo, o referente ao período de tributação com início em ou após 1 de janeiro de 2022 -, um montante correspondente a 20% dos gastos suportados referentes a consumos de eletricidade e gás natural na parte que excedessem os do período de tributação anterior, deduzidos de eventuais apoios recebidos nos termos do Decreto-Lei n.º 30-B/2022, de 18 de abril. Na génese da criação do regime extraordinário em questão estiveram, entre outros aspetos, a situação de crise energética mundialmente vivida durante o ano (civil) de 2022. Assim sendo, a criação de um regime extraordinário como o em questão poderia configurar-se como uma medida adequada, permitindo aos contribuintes (elegíveis) contrabalançar o maior dispêndio financeiro sentido no decurso do período de tributação de 2022 com a redução do IRC devido ou o incremento do prejuízo fiscal apurado. Não obstante, mediante uma análise…

O Orçamento do Estado (“OE”) de 2023 criou o regime extraordinário de apoio a encargos suportados com eletricidade e gás. O referido regime consubstancia-se num benefício fiscal, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), que, de forma sumária, permitiu aos contribuintes (com atividades económicas não excluídas para efeitos do referido regime) deduzir ao resultado fiscal – desde logo, o referente ao período de tributação com início em ou após 1 de janeiro de 2022 -, um montante correspondente a 20% dos gastos suportados referentes a consumos de eletricidade e gás natural na parte que excedessem os do período de tributação anterior, deduzidos de eventuais apoios recebidos nos termos do Decreto-Lei n.º 30-B/2022, de 18 de abril.

Na génese da criação do regime extraordinário em questão estiveram, entre outros aspetos, a situação de crise energética mundialmente vivida durante o ano (civil) de 2022. Assim sendo, a criação de um regime extraordinário como o em questão poderia configurar-se como uma medida adequada, permitindo aos contribuintes (elegíveis) contrabalançar o maior dispêndio financeiro sentido no decurso do período de tributação de 2022 com a redução do IRC devido ou o incremento do prejuízo fiscal apurado. Não obstante, mediante uma análise mais cuidada, verificou-se que o regime extraordinário estava sujeito à limitação prevista no artigo 92.º Código do IRC, intitulada como “resultado da liquidação”, pelo que em muitos casos o efeito da aplicação do regime extraordinário poderá ter sido substancialmente reduzido, e até anulado, em função da aplicação da referida limitação.

Em suma, em termos teóricos o regime extraordinário fazia sentido, contudo, em termos práticos, poderá não ter tido sempre o efeito desejado.

Ora, de forma a ajustar a aplicação prática do regime extraordinário aos pilares da sua génese, o OE de 2024 criou uma disposição transitória em matéria fiscal que prevê que a “majoração resultante da aplicação do regime extraordinário de apoio a encargos suportados com eletricidade e gás […], apurada nos períodos de tributação que se iniciaram em ou após 1 de janeiro de 2022, não concorre para o limite previsto no n.º 1 do artigo 92.º do Código do IRC”.

Assim sendo, todos os contribuintes que, por referência ao período de tributação de 2022, tenham procedido a uma correção, em sede de IRC, decorrente da aplicação da limitação do “resultado da liquidação”, que tenha sido impactada pela utilização do regime extraordinário, poderão agora rever e, potencialmente, reduzir tal correção por via da substituição da respetiva declaração anual de rendimentos de IRC “Modelo 22”.

Logo, efetivamente, o OE de 2024 pode ter impacto no exercício fiscal de 2022!

Por fim, cumpre ainda referir que o OE de 2024 trouxe consigo, também, um novo regime extraordinário bastante similar ao regime alvo de análise no presente artigo, aplicável por referência aos exercícios com início em ou após 1 de janeiro de 2023 e 1 de janeiro de 2024. Relativamente a esta “versão 2.0”, destacamos, entre outros aspetos, que:

  • A majoração de 20% incidirá sobre os gastos suportados referentes a consumos de eletricidade e gás natural (relativos a cada um dos supra exercícios) na parte em que excedam os do período de tributação iniciado em 1 de janeiro de 2021, deduzidos de eventuais apoios recebidos nos termos do Decreto-Lei n.º 30-B/2022, de 18 de abril; e

 

  • A majoração em apreço volta a não concorrer para o apuramento do “resultado da liquidação”, estando, desta feita, tal expressamente previsto.