Dos últimos anos, podemos destacar como mais marcantes, por um lado, o fim das isenções em sede de impostos sobre o património de que beneficiavam os fundos de investimento imobiliário, implementado de forma gradual entre 2013 e 2019 e, por outro lado, a reforma do regime de tributação do rendimento dos OIC que, a reboque das boas práticas internacionais, veio substituir um regime de tributação “à entrada”, na esfera do OIC, para um regime de tributação à saída, na esfera dos investidores. Se o primeiro caso, o da abolição das isenções de IMI e IMT, impactou muito negativamente a adesão dos investidores a este tipo de veículo, o segundo tinha todo o potencial para colocar Portugal no radar dos investidores internacionais. Com efeito, se o antigo regime de tributação “à entrada” penalizava muitas vezes o investidor estrangeiro que no seu país de residência acabava por ser novamente tributado sobre os lucros do seu investimento no OIC, sem possibilidade de ser compensado pelo imposto já pago em Portugal pelo próprio OIC (o que gerava frequentemente situações de dupla tributação), o reformulado regime de tributação “à saída”, ao transferir para a esfera do investidor a tributação dos lucros gerados pelo OIC, fazendo-o a taxas preferenciais quanto a investidores estrangeiros, veio repor, pelo menos no plano fiscal, a competitividade destes veículos.
No entanto, desde cedo surgiram dúvidas acerca da interpretação de alguns dos aspetos centrais do novo regime, às quais a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) não soube responder de forma cabal e satisfatória. Se o mesmo previa uma isenção aplicável a determinadas categorias de rendimento, durante muitos anos e até recentemente, a AT adotou um entendimento muito restritivo quanto ao âmbito desta isenção, o que refreou o ímpeto dos investidores imobiliários perante a incerteza relativamente à carga fiscal que incidiria sobre o respetivo investimento. Em 2020 e perante o clima de desconfiança que pairava sobre este regime fiscal, o Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais (SEAAF) emitiu um esclarecimento sobre a respetiva interpretação que permitiu eliminar grande parte das dúvidas dos investidores. Mas fê-lo a prazo, referido expressamente que tais esclarecimentos seriam apenas válidos e aplicáveis até nova alteração do regime, deixando novamente em sobressalto a comunidade investidora perante a possibilidade de nova mudança.
Com efeito, o próprio SEAAF havia determinado, no início de 2020, a criação de um grupo de trabalho ao qual incumbiu a missão de avaliar o regime fiscal dos OIC e de propor “eventuais alterações legislativas”. Sob o olhar expectante dos investidores, em dezembro de 2020, o referido grupo veio concluir que, não obstante os OIC revelarem um peso reduzido na aplicação de poupanças em Portugal quando comparado com a maior parte dos países da zona Euro e a revisão do respetivo regime fiscal ter resultado numa acentuada redução da receita fiscal associada ao mesmo, verificou-se nos últimos anos um aumento de aproximadamente 10% dos montantes sob gestão destes veículos, mais expressivo do que a evolução registada nos últimos anos de aplicação do regime anteriormente aplicável aos OIC. Tudo ponderado, reconhece assim o grupo de trabalho o relevo deste novo regime fiscal, realçando a importância da estabilidade em torno do mesmo, especialmente considerando que este se dirige a um “segmento de investidores muito sensível à incerteza e instabilidade das decisões políticas”. É assim recomendando ao Governo que o mesmo seja mantido, ainda que com um conjunto de alterações “com o objetivo de o aperfeiçoar” e de o tornar “mais previsível para os seus destinatários e mais aliciante para os investidores”.
De entre estas, recomenda-se que o regime de tributação dos investidores seja tornado definitivo e não permaneça dependente de prorrogações por parte do legislador, o que foi já acatado pelo Governo em alteração legislativa recente. Propõe-se que o regime passe a ser igualmente aplicável a OIC não residentes que invistam em ativos portugueses, assim se ultrapassando o tratamento discriminatório de que estes são atualmente alvo, como já reconhecido em certas decisões arbitrais. É ainda aconselhado o Governo a criar um regime de reinvestimento que permita diferir a tributação incidente sobre o rendimento gerado pelos investidores aquando do resgate de unidades de participação em fundos de investimento para o momento em que venha a ocorrer o desinvestimento efetivo, caso estes investidores venham a reinvestir tal rendimento na aquisição de novas unidades de participação. Por último, destacamos aquela que poderá ter um impacto mais imediato e significativo nas decisões em curso dos investidores: a criação de um regime anti-abuso aplicável à conversão de sociedades comerciais (sujeitas a um regime normal de tributação) em OIC que, em traços gerais, preveja que os rendimentos gerados pela sociedade em momento anterior à conversão em OIC ou imputáveis a períodos anteriores a esta data sejam tributados nos termos gerais e não sejam assim abrangidos pela isenção de IRC aplicável aos OIC.
Tudo somado, dir-se-á que o passado recente e o futuro próximo do regime fiscal dos OIC está longe de ser considerado estável, uma conclusão perturbante se considerarmos que o investimento imobiliário tem tido e terá um papel fundamental na recuperação da economia nacional. Tendo a figura dos OIC sido criada com o intuito de atrair investimento para a economia portuguesa, sobretudo estrangeiro, seria expectável que o poder político, o legislador e o intérprete fiscal tivessem como prioritária a passagem de uma mensagem de estabilidade, segurança e certeza os investidores imobiliários, o que continuamos a aguardar com expectativa e alguma ansiedade.