Em 2021, mais de 130 jurisdições aderiram a um projeto da OCDE que visava obter uma maior justiça no sistema internacional fiscal, de forma a adequá-lo a uma economia mundial cada vez mais globalizada e digitalizada.
De forma resumida, este projeto consiste em dois importantes Pilares. O Pilar 1 com o objetivo de realocar para as jurisdições de mercado uma parte dos lucros das grandes multinacionais que operam nesses mercados. O Pilar 2 com o objetivo de impor uma taxa de imposto mínima efetiva de 15% às grandes multinacionais em todas as jurisdições onde operam.
Contudo, numa altura em que muitos países já implementaram o Pilar 2, a chegada de Donald Trump à presidência dos EUA veio lançar dúvidas quanto à sua evolução. Isto porque uma das decisões da nova administração americana foi comunicar a não adesão a este acordo (uma posição contrária à da anterior administração) e ameaçar retaliar contra países que, através das regras do Pilar 2, cobrassem imposto calculado sobre o resultado de empresas americanas (o que as regras permitem em determinadas circunstâncias).
Esta decisão fez questionar os países em que o Pilar 2 já é uma realidade, bem como os países que ainda não o implementaram, mas que considerariam fazê-lo, uma vez que as regras do mesmo permitem cobrar imposto extraterritorial sobre as empresas americanas. Desta forma, tal como no caso das tarifas entre EUA-China, existe um claro receio de retaliações por parte de Trump caso esse imposto seja efetivamente cobrado por países terceiros. De facto, neste âmbito, Trump solicitou à sua administração a preparação medidas retaliatórias contra países que apliquem regras fiscais discriminatórias ou extraterritoriais que afetem entidades americanas, como é o caso do Pilar 2.
Qual será o futuro do Pilar 2 neste contexto?
Para que o Pilar 2 seja amplamente implementado é necessário um esforço conjunto entre jurisdições. No entanto, as ameaças da aplicação de medidas retaliatórias por parte dos EUA a países que apliquem regras fiscais discriminatórias ou extraterritoriais a entidades americanas, faz com que exista uma reflexão por parte dos países em manter o Pilar 2 (nos casos em que já se encontra em vigor) ou de não o implementar (nos casos em que ainda não vigora).
Neste contexto, existe uma incerteza em torno da evolução do Pilar 2, não sendo possível, nesta fase, prever exatamente situações futuras. No entanto, estes são alguns dos cenários que poderão decorrer, tendo em vista a situação atual:
- Os EUA acabarão por implementar o Pilar 2 – pouco provável com a atual administração americana;
- Anulação da implementação do Pilar 2 – pouco provável, dado que mais de 50 jurisdições já implementaram (onde se inclui a União Europeia) e, quer a OCDE, quer a EU, já manifestaram publicamente o compromisso com os objetivos do Pilar 2 e a intenção de manter o essencial das regras;
- Negociação entre os EUA, a OCDE, a UE e outras jurisdições – mais provável. Este cenário poderá resultar em alterações relevantes ao Pilar 2, como por exemplo a introdução de um novo safe harbour ou uma potencial abolição da componente das regras que desagrada à administração americana, e é natural que essas alterações estejam incluídas num pacote negocial que inclua outros elementos, como os impostos sobre os serviços digitais que, atualmente, afetam negativamente as grandes tecnológicas americanas.
Num ambiente instável e incerto à volta do Pilar 2, apenas existe uma certeza: as empresas multinacionais deverão continuar a acompanhar as atualizações nesta matéria, de forma a tornarem-se capazes de fazer face às potenciais consequências que possam advir deste impasse.