Opinião

Portugal e a Tributação Internacional: Mais Um Compromisso Sem Impacto?

Portugal manifesta a intenção de aderir à STTR. Será um contributo real para a tributação internacional ou apenas mais uma fonte de complexidade sem retorno?

O Pilar 2, proposto pela OCDE, tem como objetivo garantir que as multinacionais paguem um imposto mínimo, independentemente da sua localização. Este pilar baseia-se nas regras GloBE, que combinam três mecanismos: a Regra de Inclusão de Rendimento (IIR), a Regra dos Lucros Insuficientemente Tributados (UTPR) e o Imposto Complementar Nacional Qualificado (QDMTT).

No entanto, a sua aplicação tem sido bastante controversa. Um acordo recente entre os EUA e os países do G7 resultou na isenção das multinacionais norte-americanas da aplicação da IIR e da UTPR. Resultado? Um aumento da incerteza, sobretudo na Europa, onde a diretiva já foi transposta. É neste contexto que outras componentes do Pilar 2 ganham protagonismo. Uma delas é a STTR (Subject to Tax Rule), proposta pela OCDE e foco desta análise.

A STTR é uma regra autónoma, com precedência sobre as regras GloBE, que visa proteger a base tributável dos países em desenvolvimento. Como? Permitindo-lhes tributar pagamentos efetuados a jurisdições onde a taxa de imposto ajustada seja inferior a 9%. Contudo, apesar da sua aparente justiça fiscal, a regra não é consensual. De facto, alguns especialistas consideram que a versão da ONU seria preferível por ser mais simples, mais equitativa e mais respeitadora da soberania fiscal.

Embora tenha sido concebida sobretudo para os países em desenvolvimento, a STTR pode ser adotada por qualquer país, tendo alguns países desenvolvidos já manifestado interesse em fazê-lo. Ainda assim, a adesão tem sido cautelosa: das 57 jurisdições presentes na cerimónia de assinatura da Convenção Multilateral, apenas 9 assinaram. Outras 10 jurisdições, incluindo Portugal, manifestaram a intenção de aderir.

Mas fará sentido Portugal seguir esse caminho? Que benefícios reais trará — e a que custo?

A integração da STTR nas convenções para evitar a dupla tributação será feita por meio de um anexo, através da adesão a uma convenção multilateral, à semelhança do que já se verificou com a convenção multilateral da Ação 15 do BEPS.

No entanto, o seu âmbito é bastante limitado, aplicando-se apenas a pagamentos efetuados entre entidades relacionadas, excluindo-se indivíduos, entidades não relacionadas entre si e entidades como organizações internacionais, fundos de pensões, entidades públicas ou bancos centrais.

A regra incide sobre as seguintes categorias de rendimentos: (i) juros; (ii) royalties; (iii) direitos de distribuição; (iv) prémios de seguros e resseguros; (v) comissões financeiras; (vi) rendas de equipamentos industriais, comerciais ou científicos; e (vii) serviços. Na prática, interfere diretamente com os artigos 7.º, 11.º, 12.º e 21.º da Convenção Modelo da OCDE.

No caso português, surge um ponto crítico: em muitas das convenções atualmente em vigor, Portugal já tributa pagamentos de juros e royalties na fonte com taxas superiores a 10% — ou seja, acima do limiar de 9% previsto na STTR. Nestes casos, a nova regra terá um impacto meramente residual, visto Portugal já exercer esse poder de tributação.

Além disso, a STTR só se aplica se forem cumpridos dois critérios: (i) materialidade — o rendimento anual deve atingir, pelo menos, 1 milhão de euros (ou 250 mil euros, se uma das jurisdições tiver um PIB inferior a 40 mil milhões de euros); e (ii) margem de lucro — excluindo juros e royalties, só há tributação se o rendimento exceder os custos diretos e indiretos suportados, acrescidos de 8,5%.

A operacionalização da STTR também suscita desafios relevantes: para determinar se um pagamento está sujeito à regra, é necessário apurar o rendimento global do beneficiário e a respetiva taxa efetiva de imposto. Só então se pode determinar se há margem para uma tributação suplementar no Estado da fonte. Conclusão? Mais complexidade administrativa, maior necessidade de troca de informações entre as autoridades fiscais e mais incerteza para os contribuintes.

E tudo isto sem um ganho evidente para Portugal.

Em suma, apesar da retórica ambiciosa, a STTR surge como um mecanismo bem-intencionado, mas cuja eficácia é duvidosa para países como Portugal. A sua adesão poderá ter algum valor político e simbólico a nível internacional, mas, na prática, trará poucos benefícios em termos de receita fiscal e acrescentará encargos à já complexa arquitetura da fiscalidade internacional. Numa estrutura fiscal cada vez mais complexa, a introdução de mais uma camada de complexidade pode representar mais um obstáculo à clareza e à eficácia tributária do que um passo em frente.