Nos modelos globais de negócio e para fins de impostos diretos, as empresas multinacionais devem assegurar que a alocação de lucros esteja em conformidade com os estudos de benchmark realizados. Isto é feito através de ajustamentos de preços de transferência (“PT”).
Não obstante, ainda não foi totalmente esclarecido a nível europeu, como estes ajustamentos devem ser considerados para fins de impostos indiretos. Para efeitos de IVA, existe uma operação tributável quando ocorre uma entrega de bens ou prestação de serviços mediante uma contrapartida por um sujeito passivo agindo como tal e quando existe uma ligação direta entre a operação e a contrapartida recebida. De acordo com a orientação do VAT Expert Group publicado em 2018, os ajustamentos de PT devem ser considerados “fora do âmbito do IVA”, uma vez que normalmente não resultam num ajustamento na contrapartida por qualquer operação tributável, quando as partes têm pleno direito à recuperação do IVA. No entanto, quando as partes não apresentam um pleno direito de recuperação do imposto suportado, os ajustamentos de PT podem exigir uma retificação do IVA se houver uma ligação suficientemente direta entre pagamentos resultantes de um ajustamento e transmissões específicas. No entanto, como essa orientação não é vinculativa, o próximo acórdão do TJUE é aguardado com expectativa.
A este respeito, no Processo C-726/23, a empresa romena, S.C. Arcomet Towercranes S.R.L. (“Arcomet”), que faz parte do grupo Arcomet, opera no setor de aluguer de gruas. A sociedade-mãe do grupo, Arcomet Service NV, é uma sociedade belga (“Arcomet Bélgica”) que procura fornecedores para a Archomet. Conforme o estudo sobre os PT do grupo, foi garantida contratualmente uma margem de lucro operacional específica à Acromet. Assim, após registar um excedente de lucro em três anos diferentes, a Archomet recebeu três faturas, sem IVA, da Arcomet Bélgica. Do ponto de vista do IVA, a Arcomet Bélgica declarou as três faturas como prestações de serviços intracomunitárias na Bélgica, e a Arcomet declarou as primeiras duas faturas como aquisições intracomunitárias de serviços, em relação às quais aplicou o mecanismo de autoliquidação (reverse-charge) na Roménia, mas tratou a terceira fatura fora do âmbito do IVA.
Durante uma inspeção tributária, a Autoridade Tributária Romena entendeu que as três faturas se relacionavam com aquisições intracomunitária de serviços. Assim, no que diz respeito às primeiras duas faturas, recusaram o direito à dedução do IVA suportado e retiveram o IVA cobrado, com o fundamento de que a prestação de serviços em causa e a necessidade da sua execução para efeitos das operações tributáveis não tinham sido justificadas. Quanto a terceira fatura, recusaram o direito à dedução do IVA e cobraram o IVA adicional. Assim, o Processo foi remetido para o TJUE com o objetivo de esclarecer se a fatura, correspondente ao valor necessário para adequar o lucro da sociedade, constitui um pagamento de um serviço que, por conseguinte, é abrangido pelo âmbito de aplicação do IVA, ou não. Em caso afirmativo, o TJUE terá ainda de esclarecer quais são os documentos justificativos que podem ser exigidos para análise do direito à dedução do IVA dos sujeitos passivos. Aguardemos, portanto, que o acórdão do TJUE esclareça as questões levantadas para efeitos de IVA, neste dimensão conexa do Imposto Sobre o Valor Acrescentado com os ajustamentos de Preços de Transferência.