O artigo 403.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro (“OE para 2021”), instituiu o regime extraordinário e transitório de incentivo à manutenção de postos de trabalho, prevendo-se que o mesmo viria a ser regulamentado por Portaria.
Esta portaria foi publicada a 23 de julho de 2021 (“Portaria 295/2021”) visando regulamentar a referida obrigação adicional dos contribuintes para 2021, estabelecendo-se que o acesso aos apoios públicos e incentivos fiscais previstos neste regime, por parte de grandes empresas com resultado líquido positivo em 2020, ficaria condicionado à observância da manutenção do nível de emprego (“NE”) observado em 1 de outubro de 2020 até ao final do mês anterior ao da candidatura, utilização ou formação do apoio público ou incentivo fiscal (consoante o caso) e, bem assim, até ao final do período de tributação de 2021, nos termos deste regime.
Não obstante, tais termos careciam de uma dose interpretativa, tendo-se gerado diversas dúvidas na sua aplicação, o que levou à publicação no passado dia 17 de junho de 2022, do Ofício Circulado N.º 20242, contendo alguns esclarecimentos acerca da aplicação do regime.
Assim, por exemplo, para uma entidade com o período de tributação coincidente com o ano civil, o NE será obtido pela média aritmética do número de trabalhadores no último dia de cada um dos meses – o que não resultava diretamente do regime – decorridos entre outubro de 2020 (inclusive) e o mês de novembro (nos benefícios contratuais, este momento corresponderá ao mês anterior da candidatura) e dezembro de 2021, considerando-se tal condição satisfeita se esse número médio for igual ou superior ao nível observado em 1 de outubro de 2020.
Foi igualmente explicitado que as cessações de contrato por mútuo acordo não são impeditivas do acesso e utilização dos benefícios fiscais por não se encontrarem taxativamente previstas na alínea a) do n.º 5 do artigo 3.º da Portaria 295/2021, relevando apenas para efeitos da verificação do NE.
Esclarece-se ainda que esta obrigação adicional apenas vigora no período de tributação de 2021, concretizando-se que a proibição de fazer cessar contratos de trabalho ao abrigo das modalidades de despedimento coletivo, por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação (ou iniciar os respetivos procedimentos) existe (nos termos deste regime) desde 1 de janeiro até ao dia 31 de dezembro de 2021, não abrangendo o período entre 1 de outubro e 31 de dezembro de 2020. Porém, os despedimentos elegíveis, verificados neste último período, deverão ser considerados para o cálculo do número médio de trabalhadores.
Relativamente aos benefícios fiscais adquiridos em períodos de tributação anteriores a 2021, mantém-se inalterado o direito adquirido, podendo o sujeito passivo deduzi-lo à coleta do IRC dos períodos seguintes, pelo prazo remanescente.
No que respeita aos benefícios fiscais automáticos, desde que verificados os demais pressupostos legais, e ainda que não cumpridos os requisitos deste regime, é esclarecido que o direito ao benefício fiscal apurado em 2021 se mantém, ficando apenas suspensa a sua possibilidade de dedução nesse exercício, sendo reportável para os períodos de tributação seguintes.
Em face dos aspetos que importavam clarificar no contexto deste regime, e que não resultavam claros quer do OE para 2021, quer da Portaria, é sempre de saudar a divulgação dos entendimentos interpretativos, patentes no Ofício Circulado em referência, em termos de segurança jurídica dos contribuintes, incluindo a possibilidade de substituição da Declaração de Rendimentos referente ao período de 2021 até 15 de julho de 2022, sem aplicação de coimas ou juros compensatórios, desde que a mesma decorra diretamente de correções efetuadas ao abrigo deste regime.
Ainda assim, não deixa de ser uma solução que pode revelar-se tardia (quase um ano dista entre a publicação da Portaria e do Ofício-Circulado), perdendo certamente a eficácia que teria se divulgada em tempo útil, nomeadamente ainda no decurso de 2021, podendo até ter influenciado a política de investimento das sociedades naquele exercício, julgando não poder vir a usufruir de determinados incentivos fiscais e que agora possam ver esclarecida essa possibilidade.