Opinião

Teletrabalho na União Europeia: Novidades em Segurança Social

Desde 2020 que o teletrabalho passou a fazer parte da realidade diária da maior parte dos trabalhadores e empregadores, inicialmente, em virtude da pandemia, e depois pela adoção de modelos de trabalho híbrido e novas formas de trabalhar. Neste contexto, também os trabalhadores em mobilidade internacional viram no teletrabalho a possibilidade de regressar aos seus países de origem para que aí pudessem permanecer parte do seu tempo, ainda que a trabalhar remotamente para os seus empregadores estrangeiros. Ainda que o teletrabalho não seja um conceito novo, a regularidade com que o mesmo tem vindo a ser adotado tem gerado uma preocupação recorrente por parte dos trabalhadores e empregadores especialmente quanto à legislação de Segurança Social (doravante “SS”) aplicável quando o trabalhador e o seu empregador se encontram em jurisdições distintas. Com efeito, por norma, um trabalhador está sujeito à legislação de Segurança Social do país em que exerce atividade, existindo, contudo, algumas exceções que podem ser aplicadas, por exemplo no caso de se aplicarem os Regulamentos Comunitários em matéria de Segurança Social, ou caso exista um acordo bilateral de Segurança Social assinado entre dois Estados ou Convenções Multilaterais. A Segurança Social portuguesa considera, no seu guia prático intitulado “Destacamento de…

Desde 2020 que o teletrabalho passou a fazer parte da realidade diária da maior parte dos trabalhadores e empregadores, inicialmente, em virtude da pandemia, e depois pela adoção de modelos de trabalho híbrido e novas formas de trabalhar. Neste contexto, também os trabalhadores em mobilidade internacional viram no teletrabalho a possibilidade de regressar aos seus países de origem para que aí pudessem permanecer parte do seu tempo, ainda que a trabalhar remotamente para os seus empregadores estrangeiros.

Ainda que o teletrabalho não seja um conceito novo, a regularidade com que o mesmo tem vindo a ser adotado tem gerado uma preocupação recorrente por parte dos trabalhadores e empregadores especialmente quanto à legislação de Segurança Social (doravante “SS”) aplicável quando o trabalhador e o seu empregador se encontram em jurisdições distintas.

Com efeito, por norma, um trabalhador está sujeito à legislação de Segurança Social do país em que exerce atividade, existindo, contudo, algumas exceções que podem ser aplicadas, por exemplo no caso de se aplicarem os Regulamentos Comunitários em matéria de Segurança Social, ou caso exista um acordo bilateral de Segurança Social assinado entre dois Estados ou Convenções Multilaterais.

A Segurança Social portuguesa considera, no seu guia prático intitulado “Destacamento de trabalhadores de Portugal para outros países e exercício de atividade em dois ou mais Estados-Membros” que “As situações de Teletrabalho não são consideradas destacamento, visto que se aplica a legislação do Estado-Membro onde o trabalhador se encontra fisicamente a exercer a atividade.”

No que se refere à União Europeia, a Comissão Administrativa responsável pela coordenação dos Sistemas de Segurança Social publicou em meados de 2022, orientações relativamente ao impacto do teletrabalho no estrangeiro em matéria de Segurança Social, tendo concluído que, em alguns casos, as regras do destacamento ou do trabalho em mais que um estado membro podem ser aplicáveis às situações de teletrabalho. Em particular, no caso de teletrabalho em mais que um Estado-Membro, a referida comissão concluiu que o Artigo 13.º também se aplica às situações de teletrabalho prestado no estrangeiro. Exemplos abrangidos podem ser casos em que o colaborador comuta semanalmente entre o teletrabalho no estrangeiro com o trabalho nas instalações físicas do empregador, ou intervalos mais alargados de tempo são previstos ou há acordos flexíveis (ex. um máximo de número de dias de teletrabalho que é possível prestar no estrangeiro).

No caso de trabalho em mais que um Estado Membro, o Regulamento (CE) n.º 883/2004, alterado pelo Regulamento (UE) n.º 465/2012, atualmente dispõe que se um trabalhador exercer menos que 25% do seu tempo de trabalho e/ou remuneração no seu Estado Membro de residência pode continuar sujeito apenas à legislação de SS do país do empregador (no caso de ter apenas uma entidade empregadora[1]). Caso exerça uma parte substancial da atividade no país da residência (i.e. mais do que 25%), então a SS será devida nesse território, o que levanta vários desafios para o trabalhador e empregador para efeitos de cumprimento das obrigações que seriam impostas pela SS do país em causa.

Dado que são cada vez mais habituais as situações em que este limiar de 25% é excedido, Portugal e os restantes membros da União Europeia foram convidados a assinar um acordo-quadro de SS o qual dá a possibilidade de serem mantidas as contribuições para a SS no país onde o empregador está localizado durante o período de teletrabalho no Estado de residência, desde que o teletrabalho no Estado de residência não ultrapasse 50% do tempo de trabalho total.

Assim, o Acordo-Quadro ao qual Portugal aderiu com efeitos a partir de 1 de julho de 2023, vem dar a possibilidade ao empregador e trabalhador de, através da exceção prevista no artigo 16.º do Regulamento n.º 883/2004, solicitarem a aplicação das disposições do Acordo-quadro em vez das regras gerais. Pelo Acordo-Quadro, sempre que uma pessoa exerça teletrabalho num Estado(s)-Membro(s) diferente do país onde o seu empregador tenha sede ou domicílio, o trabalhador poderá continuar sujeito à legislação de SS do país do empregador, desde que (i) não exerça mais do que 50% da sua atividade no país da sua residência e (ii) continue a ter acesso remoto aos sistemas internos do empregador (que lhes permite continuar a exercer normalmente as suas funções).

A aplicação das disposições do Acordo deve ser solicitada pelo trabalhador ou pelo empregador junto da SS do país cuja legislação desejam ver aplicada, que tendencialmente será o país do empregador. O Acordo-Quadro poderá ser aplicado por um período consecutivo de três anos, renovável a pedido. Este Acordo-Quadro não poderá ser aplicado quando (i) o trabalhador exerça habitualmente outra atividade que não teletrabalho transfronteiriço no Estado Membro de residência; (ii) o trabalhador exerça habitualmente atividade noutro Estado membro que não o da residência ou do empregador; (iii) no caso de trabalhadores independentes; ou (iv) caso o trabalhador seja residente ou a atividade seja exercida num país que não esteja coberto pelo Acordo.

Por exemplo, sendo Bélgica e Portugal signatários do Acordo-Quadro, caso um trabalhador português trabalhe habitualmente na Bélgica (60%), país do seu empregador, encontrando-se em teletrabalho em Portugal, país da sua residência, no tempo remanescente (40%), então poderá manter as suas contribuições para a SS na Bélgica, ainda que trabalhe parcialmente em Portugal.

Num outro exemplo, caso 40% das funções sejam exercidas em Portugal, país da sua residência, e 60% na Bélgica, mas em que o empregador é italiano, então o presente Acordo-quadro já não poderia ser aplicado.

 

 

[1] Caso exista mais de uma entidade empregadora, diferentes regras são aplicáveis em função do Estado membro onde as entidades empregadoras disponham da sua sede ou domicílio.