Poder-se-ia, assim, antecipar um longo período de discussão no Parlamento das medidas que constassem do documento, não fosse este um ano atípico, ou pelo menos peculiar naquilo a que nos temos vindo a habituar. De facto, ao longo de 2025 assistiu-se à apresentação por parte do Governo de um conjunto de propostas de Lei, algumas aprovadas, outras ainda por aprovar, cujo efeito prático parece ser o de esvaziar a proposta de Lei do OE na sua vertente fiscal, ou mesmo reduzir os chamados “Cavaleiros Orçamentais”, os designados “cavaliers budgétaires” ou “riders”. Estas figuras consistem em disposições de natureza não financeira ou orçamental inseridas na lei do OE, materializando-se em normas jurídicas sobre matérias tipicamente fora do OE, mas que aproveitam o processo legislativo orçamental para alterar legislação que, na realidade, não apresenta qualquer conexão com matéria orçamental.
Mas, sejam Cavaleiros Orçamentais, ou não, a verdade é que em matéria de tributação Indirecta ocorreu nos últimos meses um processo legislativo relevante e com impacto naquilo que são as traves mestras do Executivo, em matéria de habitação, modernização, desburocratização e simplificação da actividade económica. Referimo-nos, em concreto, à recente proposta de Lei n.º 72/XXV/2025, a qual introduz a figura dos Grupos de IVA enquanto modelo possível de funcionamento por parte dos membros de grupos societários, apresentando como finalidade a gestão eficiente das operações de tesouraria, na lógica da compensação de saldos no apuramento do IVA, promovendo a alocação dos recursos financeiros no desenvolvimento dos negócios dos sujeitos passivos integrantes. O propósito é relevante e o impacto poderá ser material nas decisões de investimento dos operadores. E logo chegamos à recente aprovação em conselho de Ministros da proposta de Lei que prevê a redução da taxa do IVA na construção de habitação. A proposta de Lei aprovada em Conselho de Ministros do passado dia 25 de Setembro determina um conjunto de medidas para dinamizar o mercado de arrendamento e a construção de habitações a preços moderados, nomeadamente a aplicação da taxa reduzida do IVA, passando de 23% para 6% no caso do Continente, na construção de habitações para venda a preços moderados ou para arrendamento a rendas moderadas e um regime de incentivos fiscais para investimentos na construção, reabilitação ou aquisição de imóveis para arrendamento a preços moderados.
Parece, assim, que as alterações legislativas de domínio fiscal encontram-se a ser discutidas no contexto fora OE, ainda que todas elas sejam medidas com impacto orçamental no exercício de 2026 e, para as quais, deverá existir a necessária cabimentação financeira. Atendendo a que no OE de 2025 não ocorreu qualquer aumento da fiscalidade indirecta, nem tão pouco uma actualização à taxa de inflação e, ainda assim, sem qualquer aumento dos impostos indirectos o valor total da receita fiscal cresceu 8,7% até Agosto, tudo o resto constante, seria caso para dizer “não mexer para não estragar”. Há quem diga que “its the economy stupid”, ou mesmo quem recupere o chavão do “deixem-nos trabalhar”, mas a realidade é que o excedente orçamental existe e ascende a dois mil milhões de Euros, a Agosto. Mantendo-se esta perspectiva reformista e de não aumento dos impostos indirectos, entre eles IVA e Impostos Especiais de Consumo, este poderá ser o Orçamento T0, dada a ausência de medidas de natureza fiscal a que a praxis nos tem acostumado.