Opinião

Uniformização de jurisprudência relativa ao crédito de imposto por dupla tributação

Um contribuinte, residente para efeitos fiscais em Portugal, no âmbito da sua atividade (e por referência ao exercício de 2017) faturou royalties a uma entidade sediada nos Estados Unidos da América (“EUA”), tendo estes sido alvo de tributação nesse país, nos termos da Convenção para Evitar a Dupla Tributação (“CDT”) celebrada entre Portugal e os EUA – i.e., à taxa de 10%. Na qualidade de sociedade dominante de um Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (“RETGS”), o contribuinte deduziu, no exercício de 2017, à coleta de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) do grupo fiscal referido, parte do crédito de imposto por dupla tributação (jurídica internacional) apurado no exercício em questão. Sucede que, a Autoridade Tributária (“AT”) no âmbito de uma ação inspetiva ao grupo fiscal e por referência ao exercício de 2017, entendeu que a dedução à coleta de IRC relativa ao crédito de imposto por dupla tributação não se encontrava em cumprimento com a limitação prevista no n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC, concretamente, entende a AT que o contribuinte se encontrava a deduzir um montante superior face ao limite previsto na alínea b) do n.º 1 do mencionado artigo -…

Um contribuinte, residente para efeitos fiscais em Portugal, no âmbito da sua atividade (e por referência ao exercício de 2017) faturou royalties a uma entidade sediada nos Estados Unidos da América (“EUA”), tendo estes sido alvo de tributação nesse país, nos termos da Convenção para Evitar a Dupla Tributação (“CDT”) celebrada entre Portugal e os EUA – i.e., à taxa de 10%.

Na qualidade de sociedade dominante de um Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (“RETGS”), o contribuinte deduziu, no exercício de 2017, à coleta de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) do grupo fiscal referido, parte do crédito de imposto por dupla tributação (jurídica internacional) apurado no exercício em questão.

Sucede que, a Autoridade Tributária (“AT”) no âmbito de uma ação inspetiva ao grupo fiscal e por referência ao exercício de 2017, entendeu que a dedução à coleta de IRC relativa ao crédito de imposto por dupla tributação não se encontrava em cumprimento com a limitação prevista no n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC, concretamente, entende a AT que o contribuinte se encontrava a deduzir um montante superior face ao limite previsto na alínea b) do n.º 1 do mencionado artigo – “[f]ração do IRC, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, acrescidos da correção prevista no n.º 1 do artigo 68.º, líquidos dos gastos direta ou indiretamente suportados para a sua obtenção” -, desde logo, porque havia incorrido em gastos para obter aqueles rendimentos (naquele caso, depreciações), os quais não estavam a ser considerados no apuramento da fração de imposto.

Em suma, poder-se-á dizer que o contribuinte defende que a recuperação do imposto liquidado nos EUA e consequente eliminação da dupla tributação deverá apenas ter em consideração o previsto na alínea a) do n.º 3 do artigo 25.º da CDT celebrada entre Portugal e os EUA – o que permite que a computação da fração de IRC em Portugal seja aferida apenas sobre o rendimento bruto -, ao passo que a AT, sustenta que o referido artigo da CDT deverá ser analisado à luz do n.º 1 do artigo 91.º do Código do IRC – onde ter-se-ia que apurar a fração de IRC com base no “rendimento líquido” de gastos direta e/ou indiretamente suportados para o obter.

Ora, o contribuinte não se conformando com a posição da AT, e após decisões desfavoráveis ao nível (i) da reclamação graciosa submetida (contra a liquidação adicional de IRC de 2017) e (ii) da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) em resultado do recurso apresentado face à reclamação graciosa indeferida – recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) peticionando a uniformização de jurisprudência relativamente à matéria alvo de análise – dado que a decisão do CAAD (ao seu recurso) se encontrava em contradição com uma decisão do mesmo Tribunal anteriormente emitida e já transitada em julgado.

Neste contexto, o STA concluiu e uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: “[a] norma contida no artigo 91.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC, contraria o disposto nos artigos 13.º, n.os 1 e 2 e 25.º, n.º 3, alínea a), da Convenção entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 39/95, pelo que a sua aplicação é afastada nos casos que se inscrevam no âmbito de previsão e aplicação das referidas normas da CDT”.

Posto isto, os contribuintes que obtenham rendimentos com a natureza e tributação acima descrita poderão, em função da decisão do STA, estar em condições de obter relevantes poupanças fiscais, em sede de IRC, não só por referência ao presente exercício e exercícios futuros, mas também relativamente a exercícios já cessados. Por outro lado, as conclusões que se retiram da aludida decisão do STA poderão também configurar uma base sólida para a identificação de outras oportunidades com natureza similar em sede de crédito de imposto por dupla tributação, nomeadamente por aplicação direta das regras expressamente previstas nas CDT para eliminação da dupla tributação – contudo, tais oportunidades dependerão sempre das normas previstas nas CDT relevantes, pelo que será sempre necessária uma análise detalhada e casuística. Ao mesmo tempo, não sendo um tema consensual para a AT, é possível que seja necessário aos contribuintes recorrer à via judicial para fazer valer a sua posição.