Opinião

Estabelecimento Estável para efeitos de IVA e acordos de toll manufacturing – A saga continua

Resulta do artigo 44.º da Diretiva 2006/112/CE (Diretiva IVA) que, regra geral, o lugar das prestações de serviços efetuadas a um sujeito passivo que age nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sua sede económica. Reconhece-se, porém, que caso os serviços sejam prestados a um estabelecimento estável do sujeito passivo situado num lugar diferente daquele onde tem a sua sede, o lugar das prestações desses serviços é onde está situado o estabelecimento estável. O conceito de “estabelecimento estável” é esclarecido no artigo 11.º do Regulamento de Execução (UE) nº 282/2011, sendo definido como qualquer estabelecimento, diferente da sede da atividade económica, com um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que, por um lado, lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento e, por outro, que lhe permita efetuar as prestações de serviços que fornece. No processo C‑533/22 do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), este Tribunal decide sobre um litígio que opõe a SC Adient Ltd & Co. KG (Adient Alemanha) e as Autoridades Fiscais Romenas, no que diz respeito à localização das prestações de serviços em sede de…

Resulta do artigo 44.º da Diretiva 2006/112/CE (Diretiva IVA) que, regra geral, o lugar das prestações de serviços efetuadas a um sujeito passivo que age nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sua sede económica. Reconhece-se, porém, que caso os serviços sejam prestados a um estabelecimento estável do sujeito passivo situado num lugar diferente daquele onde tem a sua sede, o lugar das prestações desses serviços é onde está situado o estabelecimento estável. O conceito de “estabelecimento estável” é esclarecido no artigo 11.º do Regulamento de Execução (UE) nº 282/2011, sendo definido como qualquer estabelecimento, diferente da sede da atividade económica, com um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que, por um lado, lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento e, por outro, que lhe permita efetuar as prestações de serviços que fornece.

No processo C‑533/22 do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), este Tribunal decide sobre um litígio que opõe a SC Adient Ltd & Co. KG (Adient Alemanha) e as Autoridades Fiscais Romenas, no que diz respeito à localização das prestações de serviços em sede de IVA e à aplicação do conceito de estabelecimento estável para efeitos de IVA.

A Adient Alemanha e a Adient Roménia são duas empresas pertencentes ao Grupo Adient, que colaboraram na fabricação de componentes automóveis (estofamento de assentos). Ao abrigo do acordo celebrado entre as entidades, a Adient Roménia forneceu serviços de fabricação (que consistiam em cortar e coser as matérias‑primas fornecidas pela Adient Alemanha) e outros auxiliares (que consistiam, nomeadamente, na receção, armazenagem, inspeção e gestão das matérias‑primas e armazenagem os produtos acabados) à Adient Alemanha, que continuava proprietária de todos os materiais e produtos, durante a execução dos referidos serviços. As Autoridades Fiscais Romenas entenderam que a Adient Alemanha tinha um estabelecimento fixo, para efeitos de IVA, na Roménia e exigiram que a Adient Roménia emitisse as faturas a esse estabelecimento fixo (ao invés de as emitir ao número de IVA alemão da Adient Alemanha) procedendo à respetiva liquidação de IVA, na Roménia.

No entender das Autoridades Fiscais Romenas, tanto o facto de, por força do contrato de prestação de serviços celebrado entre a Adient Alemanha e a Adient Roménia, a primeira poder inspecionar os documentos contabilísticos e qualquer outro documento pertencente à segunda (podendo até incentivar medidas de redução de custos), como o facto de os empregados da Adient Roménia estarem envolvidos na atividade de entrega de bens exercida pela Adient Alemanha (na medida em que recebem encomendas feitas pelos clientes desta sociedade, asseguram o armazenamento e o transporte das matérias‑primas e dos produtos acabados, bem como a entrega destes últimos, são responsáveis pelo controlo de qualidade, asseguram a comunicação com os clientes e fornecedores desta , etc.) justifica a existência de um estabelecimento estável da Adient Alemanha, na Roménia.

Em sentido diferente, o TJUE começa por defender que, para que se considere que um sujeito passivo dispõe de um estabelecimento estável num Estado‑Membro no qual lhe são prestados os serviços em causa, é necessário que este disponha de uma estrutura suficientemente permanente e apta a permitir‑lhe receber esses serviços, e utilizá‑los para efeitos da sua atividade económica. Neste sentido, entende o Tribunal que o facto de as partes estarem vinculadas por um contrato de prestação de serviços exclusivo não tem por efeito, por si só, que os meios do prestador se tornem os do seu cliente, a menos que se demonstre que, nos termos desse contrato, esse prestador de serviços não é responsável pelos seus próprios meios e não presta serviços por sua conta e risco. Conclui-se assim, por exemplo, que o facto de os empregados da Adient Roménia conseguirem registar/controlar o stock de matérias-primas da Adient Alemanha (pelo facto de terem ao acesso ao sistema informático, que é comum a todas as empresas do Adient), não significa que a Adient Alemanha detenha na Roménia as infraestruturas suscetíveis de constituir um estabelecimento estável; no mesmo sentido, a existência de tais infraestruturas também não pode ser deduzida da colocação à disposição, a favor da Adient Alemanha, de um local de armazenagem dos referidos produtos.

Resulta ainda do entendimento do referido Tribunal que nem o facto de uma sociedade com a sede da sua atividade económica num Estado‑Membro e que beneficia de serviços de transformação prestados por uma sociedade com sede noutro Estado‑Membro, dispor de uma estrutura nesse outro Estado-Membro que esteja envolvida no fornecimento de produtos acabados, nem o facto de esses fornecimentos serem realizados principalmente fora desse Estado-Membro, e de aí sendo realizadas encontrarem-se sujeitas a IVA, são determinantes para decidir se o sujeito passivo dispõe de um estabelecimento estável, para efeitos de determinação do local da prestação de serviços.

Finalmente, o TJUE entende ainda que uma sociedade que adquira serviços em determinado Estado-Membro (prestados por entidade aí estabelecida) apenas poderá dispor de um estabelecimento estável nesse Estado Membro, se dispuser de recursos técnicos e humanos à sua disposição naquele território, distintos daqueles através dos quais os serviços lhe são prestados, e que não sejam apenas utilizados na concretização de atividades preparatórias ou auxiliares.

O sentido da decisão do TJUE não é inovador, tendo este Tribunal defendido posições semelhantes noutros casos (link para o artigo: https://easytax.jornaleconomico.pt/estabelecimento-estavel-para-efeitos-de-iva-a-posicao-do-tjue). Não obstante, é de salientar que o caso Adient deixa pistas relevantes para o que pode (ou não) constituir um Estabelecimento Fixo para efeitos de IVA. Ademais, não obstante a posição conhecida do TJUE, há que notar que estamos perante um assunto que comporta alguma subjetividade e que as Autoridades Fiscais de vários Estados-Membros tendem a ter uma posição mais abrangente do conceito de estabelecimento estável, o que justifica as frequentes situações de litigância com Grupos multinacionais que realizam as suas operações recorrendo a subsidiárias.